domingo, 31 de maio de 2009

Faber Castell

"You've made my life so glamorous
You can't blame me for feeling amorous.
Oh! 'S wonderful 'S marvelous
That you should care for me..."
('S Wonderful , George & Ira Gershwin)

Eu percorria as estantes repletas de todos aqueles livros , títulos , palavras , nomes estranhos que nunca li. Lombadas coloridas como caixa de lápis de cor Faber Castell nova em folha , saudade da época do jardim de infância. De vez em quando eu abria em uma página qualquer de um livro qualquer e lia uma frase pra você. Um título ou um passo de dança , pra te enternecer e te fazer sorrir.

Até agora eu não entendo como é que eu passei cerca de seis meses fazendo você esperar. E esperando que o passado me trouxesse algo de novo , quando eu não via que o presente e o futuro estavam ali do meu lado. Verde , muito verde. Havia brilho em nossos olhos e estrelas no céu , mesmo que os seus não deixassem você vê-las.

Um cantinho , um violão , um velho disco amoroso de João Gilberto que os meus pais ouviam quando namoravam. Uma canção de Gershwin - e o seu avô adora Gerswhin , e a sua vó gosta de ouvir você dizer que o tempo devia ser terno assim sempre. E menos corrido , pra gente descansar ao pé de uma árvore e jogar o relógio pra lá.

À meia luz de meia-noite passada , eu te digo boa noite e percebo o quão triste é ter uma garota e ir dormir sozinho na sua cama. Você vai embora e eu fico sempre pensando em te escrever alguma coisa e nunca escrevo nada. Se esse texto por acaso chegar às tuas mãos , é porque eu já estou dormindo - na verdade , eu estou sonhando , desde aquela praça. E envolvido nesse teu abraço , eu não tô nem um pouco a fim de acordar.

domingo, 10 de maio de 2009

Tudo O Que Eu Sempre Sonhei

Tudo O Que Eu Sempre Sonhei - Pullovers - 2009

É tudo muito estranho quando um dia começa muito mal e acaba muito bem. Foi mais ou menos no espírito de tudo muito bem , pós show de amigos , restaurante de comida mexicana e um passeio de metrô delicioso e lindo que bateu aqui na tela do meu computador que o disco do Pullovers tinha saído. Finalmente , depois de quase três ou quatro anos de espera. Mas valeu a pena esperar.

Os Pullovers , sob a batuta de Luiz Venâncio e agora com a participação especialíssima de Habacuque Lima - de outra banda favorita da casa , o Ludov - , são seguidores da boa linha de rock paulistano sobre São Paulo , como já fizeram Ronnie Cord (Rua Augusta) , Mutantes (Baby) e o IRA! (Envelheço na Cidade , Tolices).

Ou o que dizer sobre coisas como "1932" , que revisita a Revolução de 32 para falar do amor de um paulista por uma carioca , "O amor verdadeiro não tem vista para o mar" ou "Todas as Canções são de Amor". Ou a beleza do cotidiano de "Marinês" , a encantadora flor da zona Leste? E o orgulho nerd de "Futebol de Óculos"? A pureza de "O que dará o Salgueiro?" , a crueza e a melancolia de "Marcelo ou Eu Traí o Rock" e da faixa-título.

Sério , assim , na boa. Não dá pra acreditar no que esses caras cantam. É lindo , é puro , é simples. Me lembra Teenage Fanclub , pela capacidade de melodias cativantes e de dizer o óbvio sem soar óbvio. Fácil fácil , até agora , o disco do ano.

Aqui entre nós... São Paulo é a melhor cidade do mundo. Eu nunca vou cansar de dizer isso.

sábado, 9 de maio de 2009

O Menino Lucca e O Monstro do Lago Ness

Não , não é meu. Me falta inspiração total , e numa hora dessas é que a gente recorre um bocado aos mestres. Esse aqui sempre foi um dos meus preferidos do Takeda , porque fala de sol , de crianças , e de David Bowie. We can be heroes , just for one day.

O menino Lucca apareceu assim de repente, no segundo dia de praia, enquanto os dois tentavam lembrar a letra de uma antiga canção de David Bowie, entre uma lata de cerveja e outra, como se essa fosse a única maneira de escapar de todo o axé em alto volume que balançavam as suas cadeiras de plástico. E, então, junto com os versos finais de Rebel, Rebel surge ao lado de João e Julia aquela criança de cinco, seis anos no máximo, com a pele morena de sol e um sorriso que convidava à conversa. Era inevitável. E inevitável foi.

Não, eles não sabiam muito sobre crianças, somente o básico, se é que algo assim existe, e, mesmo com tantos amigos com bebês por aí, você sabe como é a vida quando se está próximo demais dos trinta anos, os dois mal conversavam sobre filhos. Mas o menino Lucca falava como se não estivesse falando com um adulto e, cada vez que João e Julia fugiam de seus baldes cheios de areia, os três pareciam ter a mesma idade, três crianças e uma brincadeira apenas. E, sem querer, a brincadeira foi crescendo a cada dia de praia. Com mais um bebê de colo para cuidar, a mãe do menino Lucca se sentiu aliviada e simplesmente deixou que o seu filho passasse todos os dias na companhia de outro casal. Eles desenharam estrelas de cinco pontas na areia. Eles construiram castelos para se esconder do monstro do Lago Ness. Julia até tentou dizer que o Lago Ness era um lago e eles estavam no mar, mas João argumentou que era muito mais emocionante ser um monstro do Lago Ness do que um monstro do Mar de Florianópolis. Eles até ensinaram o menino Lucca a cantar David Bowie.

Quando o pequeno disse que teve pesadelos com o monstro do Lago Ness na outra noite, Julia não teve dúvidas. Disse para ele acordar, respirar fundo, enxugar as lágrimas e começar a cantarolar Ziggy Stardust. Ou vocês não sabiam que a única pessoa capaz de derrotar o monstro do Lago Ness é o incrível Ziggy Stardust? Foi assim, entre monstros, canções de David Bowie e muita areia no corpo que os dois passaram aquele verão.

É claro que foi difícil se despedir do menino Lucca. E nem preciso dizer que Julia caiu aos prantos quando ele cantou, em um inglês quase perfeito, Heroes. Na estrada, de volta para casa, enquanto colocava uma foto do menino Lucca no painel do carro, João pediu para que Julia o ensinasse a cantar melhor Ziggy Stardust.

– Por quê? Você também está sonhando com o monstro do Lago Ness? – perguntou ela.
– Eu? Não, não – respondeu ele sorrindo. – Mas preciso estar preparado para quando o nosso filho sonhar.